18 de dezembro de 2010

Crônica: Desafio ao Amanhecer

Tuili F. Ferreira
Seis horas. Confesso que não é fácil despertar. Estava invadido por sonhos confusos, heterogêneos, utópicos e encantadores.  Arrasto-me até o banheiro com a toalha no ombro. No caminho, tropeço em tênis, roupas sujas, copos, pratos, que meus amigos insistem em não colocar no lugar.   
Apoio-me na pia, que deixaram imunda pra variar, e ao mesmo tempo tranco a porta. Vejo meu rosto amassado e desanimado refletido, abaixo o olhar e vou para o chuveiro. Sinto a água quente descer pelo meu corpo e meus sentidos começam, finalmente, a despertar. Pego a toalha e a enrolo na cintura, paro novamente diante da pia, escovo os dentes, checo que minha aparência melhorou  e penteio o cabelo - tem sido um desafio deixá-lo como eu gosto.  
Ao sair do sagrado banheiro, dou uma procurada rápida em algo para comer na cozinha, busca inútil, ninguém foi ao mercado. Olho para o relógio! Estou atrasado, já são seis e trinta e cinco.  O jeito é lanchar pela cantina da faculdade mesmo. Visto a primeira roupa que vejo pela frente, passo desodorante, mas o perfume não achei. Pego meu material que está todo espalhado pelo quarto, coloco na mochila, já abarrotada de coisas inúteis e saio porta afora, quase levando metade da casa com minha pressa. Ando três quarteirões até chegar a avenida principal que da acesso a minha luta diária de todos os dias. 
Ando em direção a minha conquista mais recente: a Universidade Federal do Mato Grosso, Campus II. Eu achava que passar no vestibular era a coisa mais difícil do mundo. Mal sabia eu que ir e voltar da faculdade todos os dias seria minha preocupação permanente. Caminho até chegar num ponto de ônibus que usamos como ponto de carona. O suor começa a me incomodar. Chego perto dos outros alunos que lá estavam, tiro minha mochila das costas, a coloco apoiada nas pernas e pego meu caderno, viro a contra capa na qual está escrito UFMT e seguro mostrando-a aos motoristas que passam.  
Enquanto, nós, naquela pequena aglomeração de estudantes, estamos ali, esperando que uma pessoa solidária pare e nos leve ao nosso destino, as responsabilidades que eu tenho para serem realizadas naquele dia invadem meu cérebro, me vem uma sensação de culpa, e a minha maior vontade naquele momento é o colo da minha mãe. Lamento por não ter nenhum conhecido para eu ficar conversando na tentativa de espantar pensamentos que me perturbam.  
Dia de sorte, fiquei no ponto mais ou menos quatorze minutos, entrei no Escort prata, sentei  e guardei o caderno mais útil de todos os tempos. Perguntei ao motorista onde ele iria, porque não o conhecia da faculdade - devia ter uns trinta e pouco, tinha pele morena, cabelos cacheados e era grande, tinha aliança de casado, me parecia um homem sério. Ele me disse que estava seguindo viajem para uma cidade vizinha. Durante o silêncio do percurso fiquei entorpecidamente grato aquele homem. 
O carro parou, desci rapidamente, agradeci a carona, desejei-lhe boa viagem e me virei em direção a cantina. Devorei dois salgados, tomei um refrigerante e disparei para sala de aula. Mas, durante o caminho para a sala de aula não consegui deixar de me perguntar como será amanhã.

1 comentários:

Gabii Rachid. disse...

O mais difícil é quando não temos certeza se o amanhã será como foi o hoje, e no fundo desejamos que ele seja completamente diferente! Abraços! =)